Clínicas e consultórios de enfermagem entram em evidência


28.08.2024

Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do Conselho Regional de Enfermagem de Mato Grosso do Sul (Coren-MS).

Não se trata de novidade, porém, nos últimos tempos tem aumentado o interesse de enfermeiros pela abertura dos seus consultórios e clínicas de enfermagem e isso vem ocorrendo em centros do País. Uma atividade autônoma da categoria. No Mato Grosso Sul está havendo um despertar de motivações por esse tipo de empreendimento, apesar de no Conselho Regional de Enfermagem (Coren-MS) o número de registros ainda ser relativamente pequeno.

A possibilidade de implantação dos consultórios e clínicas ganhou maior musculatura com a Resolução 568/2018, do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), que aprovou a regulamentação de tais iniciativas. Em seus considerandos, a resolução observa o disposto na Lei 7.498, de 25 de junho de 1986, que dispõe sobre as atividades de enfermagem, especialmente o seu artigo 11, inciso I, alínea “i”, que prevê a consulta de enfermagem como atividade privativa do enfermeiro. O Decreto 94.406, de 8 de junho de 1987, que regulamenta a Lei nº 7.498/86, notadamente em seu artigo 8°, inciso I, alínea “e”, de igual modo estabelece a consulta em enfermagem como atividade privativa do enfermeiro (entenda-se o portador de graduação superior). Ou seja, há respaldo legal para a iniciativa, posto que a legislação garante ao profissional o direito de atuar na prática do cuidado. Algumas categorias se insurgiram contra essa autonomia, entretanto, decisões judiciais reafirmaram a sua legalidade.

Pelo anexo daquela resolução, são consultórios de enfermagem as áreas físicas onde se realiza a consulta de enfermagem e outras atividades privativas do enfermeiro. Para atendimento exclusivo da própria clientela. Igualmente, normatiza que são clinicas de enfermagem os estabelecimentos constituídos por consultórios e ambientes destinados ao atendimento de enfermagem individual, coletivo e/ou domiciliar. O consultório está obrigado a manter registro no Conselho Regional de Enfermagem, com jurisdição sobre a região do respectivo funcionamento, como consultório para atendimento exclusivo da própria demanda. É permitida sua utilização por mais de um profissional, desde que as atividades de cada um não estejam, necessariamente, vinculadas ou condicionadas, sob qualquer aspecto, a dos demais. As clínicas deverão contar com Enfermeiro Responsável Técnico inscrito no Conselho.

Entre as atividades de um enfermeiro em consultórios e clinicas estão o companhamento pré-natal, orientação para amamentação, tratamento de feridas, aplicação de vacinas, retirada de pontos, aplicação medicação intravenosa (com receita), além de muitos outros procedimentos. De um modo geral, um consultório dessa natureza desempenha papel importante no contexto do seu atendimento, uma vez que amplia o acesso aos serviços de saúde; fortalece a atenção primária; valoriza a enfermagem como profissão; promove a continuidade do cuidado e garante a qualidade dos serviços prestados, até porque o enfermeiro é capacitado e habilitado para realizar consultas, procedimentos e ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação da saúde, garantindo a qualidade e a segurança dos serviços prestados aos pacientes. De prático, a partir da citada regulamentação, um enfermeiro pode abrir o próprio consultório ou clínica, a exemplo dos médicos, e nele executar as atividades que são privativas – alguns até nas áreas da dermatologia e estética.

Há que se alertar, contudo, que a atuação autônoma torna tais profissionais mais expostos às responsabilizações legais. Até porque como prestador de serviços passam atrair, na mesma linha dos médicos, por exemplo, o artigo 14 da Lei nº 8.078 de 11 de setembro de 1990, o Código de Defesa do Consumidor, que textualmente diz que “o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos, consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. Pelo parágrafo 4º a do mencionado artigo, a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

Isso significa dizer que qualquer erro na execução do atendimento, seja por negligência, imprudência ou imperícia poderá impactar a vida do profissional em pelo menos três áreas: civil, implicando no dever de indenizar; penal, caso haja e provocado alguma lesão; e ética, se ferir e dispositivos da Resolução Cofen 564/2017 (Código de Ética da Enfermagem). Aliás, o artigo 45 do Código, entre os deveres profissionais, impõe a prestação de assistência de enfermagem livre de danos e decorrentes de imperícia, negligência ou imprudência. Como dizem alguns, de forma simples, porém, bastante esclarecedora, há negligência quando não se faz o que deveria fazer; imprudência quando se faz o que não deveria; e imperícia quando se faz mal o que deveria ser bem feito.

É forçoso lembrar que um profissional de saúde pode ser responsabilizado quando a sua prática não se dá de acordo com o padrão de cuidado aceitável à sua formação e especialidade. Em outras palavras, toda vez que um paciente sofrer um dano decorrente da má prática e houver nexo (liame) entre ele e o ato do profissional, seja por ação ou omissão, restará a obrigação de responder, como já dito, por possíveis reflexos patrimoniais, éticos ou penais, se demandados.

Assim, faz-se (sic) necessário que o enfermeiro empreendedor esteja precavido em resguardar-se(sic) de contratempos futuros que poderão afetar as finanças e, principalmente, a credibilidade do seu consultório. Daí, ser importante o suporte de uma assessoria jurídica especializada e consistente.

As cautelas são as mesmas recomendadas aos profissionais médicos. Que haja uma conduta sempre preventiva, preocupando-se com o paciente e sua integridade; manter-se sempre atualizado nos conhecimentos e avanços em sua área de atuação; elaborar e conservar organizados os documentos relativos aos procedimentos, como prontuários, termos, etc. Além disso, nunca é demais destacar a necessidade de uma relação humanizada com o paciente. Cuidados como esses serão de grande valia no futuro, evitando possíveis dissabores – leia-se processos.

*Artigo – Dr. Thiago Gomes da Silva; Advogado Especialista em Direito da Família e Sucessores e pós-graduando em Direito Médico e da Saúde

Texto publicado originalmente em: Revista Saúde+ Ed.15 – Agosto/2024

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